Existem pessoas muito mais aptas para definir a assistência ao próximo do que eu ou você. Somos apenas reprodutores de ensinamentos passados por outros e, por isso, "beber na fonte" acho que é a maneira mais saudável para se iniciar uma conversa que visa abordar o tema da caridade.
Eu, por minha parte, acho que a melhor definição da caridade (assistência ao próximo) foi dada pelo Espírito da Verdade ao responder a Kardec: "benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas" (pergunta 886 do LE). Creio que estas frases encerram todas as citações que você fez além de também servirem de base para centenas de outras definições que conhecemos sobre o tema.
Mas, creio que apenas conhecer a definição sobre o que é assistir ao próximo não encerra o debate, pois a assistência é uma ação e, portanto, cercada de mais elementos. Ninguém assiste simplesmente, mas presta assistência a alguém e de alguma forma. É exatamente aí, para mim, que se inicia o problema da nossa ignorância (falta de conhecimento).
Todos aqueles que fazem da caridade uma bandeira de vida afirmam estar se comportando dentro dos preceitos fundamentais de tal ação, mas isto não é realidade. Para mim a caridade praticada no planeta Terra é "capenga" ou viciada, pois ela não avalia estes aspectos (quem e como) para a sua existência. Deixe-me expor um pouco mais fundo esta posição.
A quem prestamos a assistência? Aos carentes materiais. Ninguém se preocupa com os abastados na hora de buscar assistir o próximo, mas apenas com aqueles que estão passando "necessidades". Assistimos aos famintos, doentes, as crianças abandonadas e aos velhos nos asilos, mas esquecemos daqueles que tem o que comer, saúde e vivem integrados às comunidades cercados de "amigos". Por que?
Porque nossa assistência é fundamentada em valores materiais. Para nós somente os que materialmente falando estão carentes precisam ser assistidos. Será que isso é verdade? Claro que não. A assistência deve ser direcionada a todos e não apenas àqueles que, a partir de nossos critérios, necessitam dela.
Porque não assistimos aos abastados? Porque imaginamos que eles não precisam. Afinal de contas, eles já têm tudo aquilo que dizemos que é necessário para a existência carnal, para que precisariam receber caridade? Será que isto é verdade?
Novamente é claro que não. Tanto o ter como a carência (não ter), são apenas provas para o espírito, ou seja, não são posses materiais, mas instrumentos de carma. Todos somos espíritos vivendo nossas provações e temos que nos apoiar mutuamente para podermos superar nossas vicissitudes (alternância entre ter e não ter). O rico precisa tanto da assistência espiritual como o pobre, o com saúde precisa tanto da caridade como o doente, os acompanhados precisam, às vezes muito mais, do apoio do que aqueles que estão nos asilos e nos orfanatos, pois também estão vivendo uma etapa da vicissitude, que é o elemento da expiação em uma encarnação.
Você me dirá que também presta assistência aos abastados, que os ama, mas será que isso é real? Como posso provar que não prestamos assistência a todos, mas apenas àqueles que achamos que precisam de nossa ajuda? Verificando que não somos benevolentes, indulgentes e nem perdoamos sinceramente aqueles que tem posses dentro dos critérios materiais. Para os carentes temos sempre a palavra de apoio e carinho, mas para os abastados está sempre presente a crítica por não dividirem seus bens, por não auxiliarem o próximo. Onde a benevolência, a indulgência e o perdão a eles?
Na realidade aqueles que na nossa avaliação não precisam da caridade são os elementos que necessitam muito mais da nossa assistência (benevolência, indulgência e perdão) do que os carentes, pois estes são irmãos espirituais que estão afastados de Deus.
É muito mais fácil você ver, por exemplo, alguém que não tem o que comer estar em paz com Deus e com a vida do que aqueles que possuem muitas opções para escolher. Estes, pelo ilusório poder de imaginar que podem ter o que quiserem se deixam prender-se às paixões criadas pelo ego e sucumbem aos desejos, gerando o apego ao mundo material que, conforme todos os mestres ensinam, nos afasta de Deus. São, portanto, carentes, espiritualmente falando, e precisam de nossa assistência.
Mas, por que não enxergamos isso? Porque estamos presos à ilusão fantasmagórica da vida.
Não assistimos o abastado porque para a assistência consideramos apenas os valores materiais e não os espirituais. Achamos que eles já tem tudo que se pode ter (bens materiais como condição financeira, subsistência, saúde, etc.). Na verdade não os assistimos porque ainda nos interessamos pela vida humana, porque queríamos ter tudo o que eles tem para nos sentirmos realizados.
Apesar de nos dizermos espiritualistas ainda achamos que a realização material (paz, saúde e felicidade fundamentadas no elemento material) é o que mais importa. Esquecemos que o que importa nesta vida é a realização espiritual e que o único bem que levamos dela é a capacidade de ser feliz incondicionalmente, que é o fruto do amor a todos e a tudo.
Tudo que é material acaba com a morte. A saúde, a prosperidade material e a felicidade embasada em posses materiais encerram-se com o desencarne. De volta ao mundo real o espírito vai viver outra realidade, outras necessidades. A saúde e a capacidade de prover o seu sustento não possuem mais valor algum para ele. Apenas o quanto formos felizes a partir da comunhão com Deus é o que importa para o espírito.
Portanto, de nada adianta buscarmos compreender o que é assistência enquanto a realizarmos apenas aos carentes materiais. Devemos primeiramente nos concentrarmos em nos tornamos aptos para assistir a todos. Mas, isto só conseguiremos quando perdermos o interesse pela realização material (ter alimento, saúde e prosperidade), ou seja, quando não mais tivermos como padrão de auto realização os valores humanos, mas apenas os espirituais.
Quando o fiel da balança para se determinar quem precisa de nossa assistência não for mais os "sonhos" materiais, mas apenas a realização espiritual em vida, poderemos, então voltar a pensar em assistir ao próximo. Enquanto isso, busquemos entender o ensinamento de Cristo (quem quiser ganhar a sua vida, a perderá) e lutar para se libertar dos nossos padrões que determinam aqueles que precisam de assistência e aqueles que já tem tudo o que poderiam ter.
Esta é a melhor assistência que podemos realmente prestar a qualquer irmão espiritual encarnado neste momento de nossa evolução espiritual.