A vida do ser humano é vivida como se fosse um romance. Ele não vive as possibilidades das realidades que podem acontecer porque incutiram na cabeça dele o sonho de uma vida romanceada desde a mais tenra infância.
A mãe quando dá uma boneca para a filha e a ensina a brincar de casinha não mostra a dureza que é ser dona de casa. Ela apenas mostra o lado bom daquela atividade e não o esforço físico que precisa ser feito para se manter uma casa organizada e uma família estruturada. Com isso cria uma verdade que não é real. A dureza da vida mais tarde será cobrada deste ser humano e ele, ainda apegado à brincadeira de casinha, sofrerá com a realidade.
Já repararam nos livros humanos? Eles acabam sempre com o viveram felizes para sempre. Vocês conhecem alguém que conseguiu ser feliz para sempre? Conhecem alguém que a partir de determinado momento deixou de ter problemas no seu relacionamento? É por viver o sonho que está na mente de que existe o viver feliz para sempre os seres humanos sofrem com a realidade de seus relacionamentos.
Vocês já repararam nas novelas da televisão? Sempre um personagem fala dos problemas que existem em sua vida naquele momento. Por que isso acontece? Porque a vida deles naquele momento virou novela... Antes da existência daquele personagem entrar no ar tudo era bom, depois que sair haverá o feliz para sempre...
Isto é o mesmo que ocorre aos espíritos. Antes da encarnação sua vida era boa e depois que sair dela voltará a ser. Mas, enquanto estiver encarnado, não poderá ser. Enquanto a peça ‘minha vida humana’ daquele espírito estiver no ar haverá sempre o momento bom e o mal. Isto é desta forma porque como já vimos, os objetivos da encarnação ensinam que a expiação consiste-se em viver uma existência marcada pelas vicissitudes.
“Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação”. (O Livro dos Espíritos – pergunta 132).
Se o ser humano não espiritualista (aquele que não acredita haver em si algo mais do que a matéria) deveria aprender a viver a vida preparando-se para as múltiplas possibilidades de acontecimento, o espiritualista mais ainda. Acreditar que existe encarnação, que está vivendo uma e ainda assim compactuar com a existência romanceada que a mente cria, é ir frontalmente de encontro àquilo que diz acreditar. É uma hipocrisia.
Participante: não deveria haver um programa na televisão que mostrasse isso que o senhor está falando?
Sim, deveria haver um programa de televisão que ensinasse a viver, deveria haver uma cadeira nas faculdades que também ensinassem, as mães deveriam ensinar os filhos de forma diferente, os livros deveriam ser escritos dentro da realidade e não de uma forma romanceada... Sim, poderia haver diversos dispositivos que ajudassem o ser humano a viver a sua vida. Mas, antes de encontrarmos culpados, deixe-me dizer algo.
Não estou falando com nenhuma criança. Aqui todos são seres humanos maduros, vividos, que se imaginam capazes de raciocinar, perceber realidades e criar compreensões. Por isso pergunto: você não acha que já está bem grandinho para chegar ás conclusões que expus aqui por si só? Será que a sua observação do que acontece neste mundo não poderia lhe levar a esta conclusão mesmo antes de eu falar alguma coisa?
Vocês são seres humanos que se dizem capazes de compreender coisas, então já deveriam ter chegado a estas conclusões mesmo antes de eu fala sobre este assunto. Sendo assim, não busque culpados... Se alguém algum dia contribuiu para que você vivesse num mundo romanceado, pela sua imaginária capacidade de compreender as coisas você já poderia ter desfeito o que foi feito e não desfez.
Mas, não desfez por quê? Porque não conhece a si mesmo. Não vê que ao invés de enfrentar a vida de uma forma madura prefere viver dormindo apegado ao sonho de que um dia conseguirá ser feliz para sempre. Como não se conhece, não vê que apesar de se dizer um ser humano maduro continua apegado ao sonho de que pode ganhar sempre. Conhecendo-se veria que é uma criança incapaz de compreender a vida, pois se fosse realmente maduro, se tivesse realmente a capacidade de compreender a vida, veria que o apego a este sonho de conseguir sempre o que deseja lhe custa caro.
A vida esporadicamente realiza aquilo que você quer. Esporadicamente... Na maioria das vezes ela acaba acontecendo de forma diferente daquilo que você deseja. Quando isso acontece, você sofre... Ou seja, você sofre muito para esporadicamente ser feliz...
Na verdade, o sofrimento não acontece por causa de determinados acontecimentos. Ele é decorrência de uma contrariedade, ou seja, ele é decorrência do seu desejo não ter sido contemplado pela vida. Não importa o que aconteça, se aquilo satisfizer o que você queria, não haverá sofrimento. Veja bem. Um dos grandes motivos de sofrimento dos seres humanos é a morte de alguém. Mas, será que você sofre com a morte de todos? Não. Se morrer alguém que você não gosta e que por isso não tem o desejo de que ele permaneça vivo, você não sofre. Diz: este já foi tarde...
O sofrimento, portanto, não está no acontecimento, mas é uma forma de reagir a determinados acontecimentos e o ser humano só se expressa dessa forma quando o que acontece não satisfaz seus desejos. Se você não vivesse apegado ao sonho romanceado de que a vida sempre satisfará seus desejos (viver feliz para sempre), ou seja, estivesse preparado para viver as vicissitudes da vida, não teria motivos para se expressar através do sofrimento.
Isso tudo o que disse aqui é apenas conclusão da observação da vida de qualquer ser humano. Não possui nada de profundo ou filosófico: basta observar a vida humana de uma maneira imparcial que se chega a esta conclusão. Você se diz capaz de observar as coisas e raciociná-las: porque não chegou a esta conclusão há mais tempo?
Portanto, não culpe ninguém pelo que você vive, mas a você mesmo que não dedica tempo para observar e pensar a vida. Aliás, culpar outras pessoas por aquilo que nos acontece é uma grande hipocrisia.
Primeiro porque o sofrimento não está pelo que os outros fazem, mas sim como uma forma de se expressar do ser humano que foi contrariado. Segundo porque ninguém é culpado por você viver desse jeito. O único culpado é você que mesmo dizendo-se capaz de entender o Universo não busca compreender você mesmo e a vida que vive.