Participante: já acompanho o senhor há algum tempo e sempre que ouço suas conversas encontro diversas fórmulas para conseguir realizar o trabalho do despertar. Quando tenho acesso a estas fórmulas parece tudo tão simples e lógico, mas depois vem o dia a dia com suas emoções e razões que acabam soterrando a intenção de viver dentro das fórmulas que o senhor dá. Não consigo entender bem o porquê dessas coisas, mas o resultado é que hoje me sinto vivendo mais tranqüilo do que vivia antes.
Você falou numa coisa muito interessante: depois vem O dia a dia com suas emoções e razões. Por causa delas você acaba vivendo as realidades criadas pela mente como se fossem suas. Por que isso acontece?
Porque a cada vez que a mente cria uma proposição de acontecimento para você há uma força que se junta a esta proposição que lhe dá o valor de realidade. Você entende que tudo na sua vida é um sonho, mas a idéia de que é casado com aquela mulher é algo tão palpável que não consegue ver que é apenas um sonho. Por causa desta sensação de realidade que é colocada na criação da mente você não consegue separar o sonho da realidade.
Tudo que a mente cria é apenas um sonho que recebe uma força que lhe dá a convicção que seja realidade. Tudo... Se você acredita que compreendeu tudo o que disse aqui, esta compreensão não foi sua, mas sim da mente. A crença de que foi você que entendeu e não a mente é que lhe faz prender-se ao sonho de que realizará o que foi dito.
Portanto, você não compreendeu, a mente criou uma compreensão, e não vai ser você que vai por em prática ou não, será a mente. A você cabe duvidar de tudo isso para poder fazer alguma coisa.
Mas, apesar disso, você ainda me diz: o resultado é que hoje me sinto vivendo mais tranqüilo do que viva antes. Quem está vivendo mais tranqüilo: você ou a mente? Veja, você tem uma razão que lhe diz que está vivendo mais tranqüilo, mas não está. A tranqüilidade que está vivendo não é sua, mas uma criação da mente e, portanto, é o sonho de estar.
Quando acredita que está vivendo mais tranqüilo imagina que está despertando, mas não está vendo que é apenas um despertar para outro sonho. Você está sonhando o sonho de despertar.
Para que esta realidade ilusória possa ser criada o que a mente lhe diz? Que tudo isso aconteceu porque você se expôs às nossas conversas. Como está sonhando que está conseguindo acordar, você aceita que isso é real, que precisa ouvir aquilo que falamos para que possa despertar. Pronto, você já está ligado ao sonho de ter que ouvir nossas conversas e pronto para vivenciar apenas o círculo do prazer e da dor. Por acreditar em todo este sonho como um despertar, quando a mente criar a ilusória realidade que está me ouvindo vai viver o prazer que ela criará; quando viver a de não conseguir estar presente em uma de nossas conversas, vai viver o desprazer de não ter podido ir. Preso ainda ao sonho de que é você que compreende e que realiza o despertar, aceitará placidamente o louro de ter conseguido fazer e com isso estará pronto para a depressão do não conseguir que a mente criará para poder mantê-lo preso ao ciclo do prazer e da dor.
Nada do que lhe é consciente pela razão é feito por você: tudo é só obra da mente. É ela que cria o que é ouvido, é ela que cria a conclusão, é ela que fará ou não. Toda realidade que lhe chega a mente através da razão não tem nada a ver com a sua realidade, mas sim acontecimentos gerados pela mente que falam de uma participação sua neles e que por causa da força de realidade que é impingido a este sonho você acredita que fez.
Eu já falei diversas vezes ao longo de nossas conversas: vocês acreditam que eu imagino que vão fazer o que digo? Não tenho a menor expectativa disso. Mesmo assim, se alguma coisa acontecer e vocês tomarem consciência que fizeram, tenho a plena consciência de que não foram vocês que fizeram. Foi a mente que realizou aquilo e disse que foi você que realizou. Como está não vigilante, ou seja, aceita que está despertando, continua sonhando sempre, ou seja, achando que você e a mente são a mesma pessoa.
Todas as conclusões racionais que a mente cria são ilusões. Não importa se as suas criações premiam o certo ou o bom. Mesmo que a ilusória realidade que ela crie seja aparentemente um despertar, na verdade ainda é um sonho no qual está embutida a idéia de ter feito, ter sido ou ter estado da forma e no lugar que ela mesma lhe diz que é o certo. Ou seja, ela não se prende realmente aos valores, mas brinca com eles para sempre lhe manter sonhando.
Portanto, não importa o que a mente diga: não acredite que ela é você. Quando ela diz que existe um Joaquim e que você o conhece, não acredite nisso. Não acredite que o ensinamento foi ouvido por você, não acredite que você mudou a sua vida. Aliás, não acredite nem que você exista, pois aquele que você acredita que é trata-se de uma criação ilusória da mente que recebe a força de existir só porque ela cria a imagem no espelho.
Nota: apesar de nesta conversa o amigo espiritual não ter nomeado esta força que dá o poder de realidade ao sonho, posteriormente ele a nomeou como sendo ‘o inescrutável poder de maya.