Sofrimento - Textos

O valor que se dá a felicidade

Participante: ainda estou cismada com o assunto depressão, pois sempre achei que fosse uma tristeza imensa do espírito.

Não. Depressão é uma tristeza imensa criada pela mente que o espírito absorve. Absorve porque acha errado ter essa doença. Ele acha errado, absorve o sofrimento de ter.

O espírito não cria, ele absorve o que vem pela mente, seja prazer ou dor.

Participante: mas, pensando que supostamente nós sempre estamos em busca de satisfazer os nossos desejos para alcançar a felicidade, mesmo sabendo que isso leva ao sofrimento, porque busco algo que na verdade é tão desconfortável e traz tanto sofrimento?

Porque você continua buscando o que traz sofrimento se não quer sofrer? Seria essa a sua pergunta?

Participante: sim, pensando principalmente dentro dos transtornos mentais.

Por causa da não vigilância, por causa do valor que dá às coisas. É o que já falei: se não quiser sofrer, deve estudar por estudar e não porque tem que vencer, porque tem que fazer.

Você sabe que estudar porque tem que vencer causa sofrimento, não sabe? Porque se entrega a essa ideia, então? Porque, apesar de dizer que quer ser feliz, não dá à sua felicidade um valor tão grande quanto diz que dá. Se valorizasse mais a sua felicidade, não sofreria tanto.

Você dá mais valor às conquistas materiais. Essa questão está exatamente dentro do assunto dessa segunda parte: a vida na carne e a felicidade.

Me permita dar um exemplo seu para entendermos melhor: você dá mais valor a casa arrumada para receber os outros do que o seu cansaço de arrumar. Por isso cria a ideia de que tem que arrumar para as pessoas se sentirem bem. Não para de achar que precisa arrumar, mesmo sabendo que por causa da arrumação sentirá cansaço e irá sofrer.

Acontece que a justificativa para fazer é uma ilusão. Mesmo dizendo que faz porque se preocupa com os outros, o que a mente quer é que as visitas digam: ‘ela arruma a casa!’

Posso afirmar isso porque tudo que a mente quer está preso nas ‘Quatro Âncoras: ganhar, ter o prazer, buscar a fama o reconhecimento e o elogio. Ao observar que os outros viram a limpeza, a mente acha que teve uma vitória. Quando você comunga com isso, prova dá mais valor ao vencer do que ser feliz.

Quando conseguir fazer a limpeza sem se preocupar se está fazendo o melhor, se está fazendo o bom, faz sem sofrimento. Ah, e sem cansaço ...

Participante: é sem intenção?

Não se trata de intenção, mas do valor que se dá às coisas.

Participante: mas, o valor não é uma sinapse, não é a mente brigando com a mente?

Não. A mente dá o valor e você, espírito, não pode concordar com ela. Deve fazer isso consciente que o melhor para você não é que os outros vejam sua casa limpa, mas sim que esteja em paz, bem, independe da limpeza que fizer.

Como não trabalha com essa escala de valores, a mente lhe faz fazer muita coisa. Por causa desse trabalho físico, você sofre. Além disso, não importa o quanto faça, quando a pessoa chega você não está satisfeita com o que fez. Sofre porque acha que faltou fazer algumas coisas.

Como foi dito, as palavras são difíceis, mas a verdade é esta: vocês dizem o tempo inteiro que querem ser felizes, mas abandonam a felicidade em troca de outras coisas. Em troca de ganhar mais.

Por exemplo, no caso do estudo. O ser encarnado troca a paz de espírito pela obrigação de ter que fazer uma faculdade. Vive tenso com relação à aprovação para entrar numa faculdade, porque se sente obrigado a conquistar um diploma. Para que? Para poder arrumar um emprego melhor, para poder ganhar mais dinheiro. Para que? Segundo vocês, para ser feliz. Só que deixam de ser feliz ao se sentirem obrigado a fazer uma coisa.

Por achar que aquela coisa iria dar a felicidade, você abandona a paz de espírito, algo que nenhuma conquista nesse mundo vai lhe dar. Se realizar os seus estudos mantendo a paz, ou seja, estudar sem se sentir obrigado a conseguir a aprovação, sem obsessão, sem ficar desesperado, consegue a realização e vive todo processo com paz de espírito.

Essa forma de viver mostra o grande problema do ser encarnado. Ele, por ceder ao que a mente diz, acha que a felicidade vem de fora para dentro. Isso é falso. Felicidade é uma coisa que o próprio ser deve colocar no que está acontecendo. É por isso que, apesar de querer ser feliz, não consegue ser: porque ainda espera que as coisas deem felicidade.

É por causa dessa esperança que o ser encarnado sofre ao querer as coisas que não dão felicidade. Sofre com a ansiedade de conseguir, sofre pela ansiedade, sofre por ... É sofrimento antes, durante e muitas vezes depois, pois dificilmente se contenta com aquela conquista. Quando consegue uma coisa, quer sempre outra melhor ou mais moderna.

Voltando à questão do estudo, o que acontece com aqueles que fazem a faculdade por obrigação? Não são felizes ... Quantos doutores trabalham atrás de um balcão? Adiantou se desesperar, lutar para conseguir o diploma e depois viver infeliz com aquilo que realizou? Quantos jovens escolhem hoje a sua profissão de olho naquela que vai dar mais dinheiro quando se formarem e aí vão ser sempre profissionais frustrados?

Com relação a questão da profissão, costumo dizer o seguinte. Imagine você morando em uma cidade grande. Em algum momento as pessoas que fazem esse trabalho não passam na sua porta para recolher o lixo. Como vai ser a vida na cidade? Horrível, não é? Vendo por esse ângulo, posso dizer que lixeiro é uma profissão importante, não é? Para o filho dos outros, não para o seu ... O seu tem que ser um doutor ...

Acho que esse texto lhe responde: você não é feliz porque tem padrões para ser feliz.

Participante: acho que essas ‘Quatro Âncoras’ são a pedra de roseta, pois tudo cai nelas. Não é?

Sim, isso é real, pois as ‘Quatro Âncoras’ são o instrumento do egoísmo. Todo egoísmo é fundamentado na busca do prazer, da vitória, da fama e do elogio.

Só que para poderem observar a ação dessas âncoras é preciso se conhecerem. Conhecerem o que é importante para vocês.

O que é mais importante para você? Estar em paz ou conseguir realizar algumas coisas? Estar em paz ou ganhar mais dinheiro? Estar em paz ou conseguir viver em uma família harmônica?

Se não se conhecer, souber os valores que as coisas desse mundo têm, você não vai conseguir a paz. Só que esses valores só serão conhecido olhando para si mesmo. Como diz Santo Agostinho, a mente não fala a verdade sobre nós mesmos. Só conseguiremos conhecer a importância que as coisas têm olhando o que falamos para os outros.

Aquela pessoa acha importantíssimo ser feliz. Será que acha isso mesmo? Se fosse realmente tão importante, quando o quarto não estivesse arrumado ela não a jogaria fora. Quando aceita viver em desarmonia porque o quarto está desarrumado, está mostrando para si mesma que a felicidade não é tão importante assim. Como ela quer ser feliz, se não trata a felicidade com importância maior do que ter um quarto arrumado?

Investigar a vida. Que coisa difícil... Mas, se você não investiga-la e descobrir a verdade – a verdade da vida é esta: eu sou um hipócrita – continuará dizendo que quer ser feliz, mas um quarto desarrumado irá lhe tirar a paz.

Portanto, na vida dessa pessoa há um trabalho para ser feito. Qual é? Não depender do quarto arrumando para ser feliz. Enquanto não conseguir não depender, o que fazer? Ir lá e arrumar do jeito que você quer ou aprender a viver com a bagunça.

Para qualquer contrariedade, há diversas soluções que podem alcançadas. A única que não pode ser tomada – e que é a primeira que vocês tomam – é jogar fora a felicidade.