Enviar texto por Telegram
(Gálatas 2, 1-4)
Catorze anos depois, voltei a Jerusalém com Barnabé e levei também Tito comigo. Fui lá porque Deus me revelou que eu devia ir. Ali, numa reunião particular com os líderes da igreja, expliquei o Evangelho que anuncio aos não-judeus. Eu não queria que o trabalho que tinha feito ou estava fazendo ficasse sem efeito. Nem mesmo o meu companheiro Tito, que é grego, foi obrigado a circuncidar-se. Mas alguns, que queriam passar por irmãos e tinham se juntado ao grupo, queriam circuncidá-lo. Esses homens entraram ali como espiões para observarem a liberdade que temos por estarmos unidos com Cristo Jesus. Eles queriam nos tornar escravos.
Esse trecho onde o apóstolo Paulo avoca para todos os cristãos a liberdade que Cristo concede pelo exercício da fé a todos aqueles que são amorosos é muito importante para a elevação espiritual. Como Paulo diz, aquele que procura a elevação espiritual não pode se tornar escravo de nada.
Lembremos o ensinamento do Mestre: venham a mim que o meu jugo é leve. O que será que Cristo quis dizer com essa afirmação? Será que quis afirmar que perdoa a todos indistintamente, independente do que façam? Vamos aproveitar essa passagem e compreender o significado desse trecho do Evangelho.
Para Cristo existem apenas duas leis: amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Mais nada é lei para o Mestre.
O jugo leve de Cristo baseia-se no fim das proibições, ou seja, na determinação do que é certo ou errado. Para Cristo não existe leis que façam o ser se aprisionar, se tornar escravo, ter que seguir o que ela determina.
Para o Mestre, em vez de se submeter a leis, a padronização de ações que são executadas pela coerção e pelo medo, o espírito encarnado precisa alcançar algo que pode ser definido como consciência amorosa da ação.
Quando o ser humanizado alcança esta consciência não é mais prisioneiro de uma lei, não se sente obrigado a fazer nada de uma determinada forma. Ele age amorosamente, age consciente do seu amor a Deus e ao próximo.
Vamos entender as duas questões, pois até hoje os cristãos estão submetidos a diversas leis que o próprio Cristo expurgou durante aquela encarnação missionária.
Quando você segue uma lei, por exemplo, não matar e deixa de praticar porque é proibido matar, se torna escravo da lei. Deixa de matar por obrigação, porque é proibido, porque poderá sofrer consequências desse ato. Neste caso, se tornou escravo da lei.
Na hora que amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, adquire a consciência de não matar por amor. Não matar porque ama a Deus acima daquilo que o outro fez, porque ama o próximo, apesar dele ter feito aquilo. Aí você é livre, livre para não matar o próximo, mesmo ainda não gostando do que ele fez.
Essa é a diferença entre a consciência amorosa e a prática da ação porque é proibida. Quando você não faz porque é proibido, vira escravo da lei, pois ainda tem o desejo de fazer e não faz pela obrigação de não fazer. Quando tem a consciência amorosa, não há o desejo de fazer e por isto está livre de ter que fazer ou não.
Foi a isso que Cristo se referiu quando questionado sobre o cumprimento da lei: da lei não se tira um ponto ou uma vírgula, mas eu vim para dar o real sentido da lei. A lei diz não matar e dela não se tira nem um ponto ou uma vírgula, mas o real sentido não é “não matar”, mas ame que jamais terá vontade de matar.
Com relação ao aspecto lei, Paulo é muito categórico: se Moisés já havia trazido a tábua das leis, o que Cristo veio fazer então? Ele veio ensinar a cumprir a lei. Em vez de colocá-la como parâmetro obrigatório, como coerção, entenda-a como a realização daquele que ama incondicionalmente.
Quem vivencia esse amor que chamamos de universal não tem desejos de matar, adulterar, roubar, etc. Por isto não sofre jamais.
É por isto que Cristo diz: venha para mim que o meu jugo é leve. Venha para mim porque comigo você não terá desejos que lhe farão sofrer pela escravidão à lei.
A palavra jugo refere-se à canga que é colocada no boi para fazê-lo andar. O jugo de Cristo, ou aquilo que lhe faz viver é leve, não pesa. Já a obrigação de fazer pesa, pois ainda existe o desejo.
O desejo lhe impulsiona a querer realizar, dá a vontade de realizar, mas como a lei proíbe, você deixa de fazer e sofre com o desejo não realizado. Por isto o jugo da lei é pesado.
Mas, o jugo leve, a consciência amorosa, elimina o desejo e com isso você não sofre. Esta é a diferença entre a consciência amorosa e o servilismo à letra fria da lei.
Aliás, sabe porque você sofre na vida? Porque vive com leis, porque quer seguir a um determinado padrão. Impõe a si regras, normas e convenções padronizadas às quais se aprisiona e com isso sofre quando deseja fazer algo e não pode porque é proibido.
Sabe porque o sapato aperta? Não porque é um número menor, mas porque você o usa por regra, por norma, porque se sente obrigado a andar de sapato para ficar bonito para os outros, enquanto o desejo de liberdade (pé no chão) está dentro de você.
A lei da etiqueta proíbe que saia descalço e você se subordina a ela. Mas por que será que ela proíbe quando andar descalço traz muito mais felicidade? A sociedade age como se o pé fosse uma coisa feia, uma coisa que precisasse ficar escondido. Qual o problema de você andar descalço? Apenas o padrão imposto pela sociedade.
Então, sofre dentro de um sapato apertado porque a sociedade diz que tem que andar de sapato. Aí submete-se à essa regra por obrigação e por causa desse jugo pesado sofre.
Coitado do sapato: ainda é considerado culpado.
Participante: meu caso específico e particular. Eu não posso entrar no meu serviço sem sapato e o sapato realmente aperta muito o meu pé. Como fazer?
A pergunta é interessante. Você não pode entrar no seu trabalho descalça e aí o sapato aperta o seu pé. Por que? Porque gostaria de estar sem sapato, pois se sente bem descalça.
Então, com o desejo agindo e a lei bloqueando a realização dele, o sofrimento ocorre inexoravelmente. Na hora que se conscientizar de que é impossível estar ali sem sapato e eliminar o desejo de, naquele momento, estar descalça, anulará o desejo.
Silencie o ego que ,naquele momento, está dando o desejo de ficar descalça dizendo para ele que quando estiver fora dali tirará o sapato, mas que naquele momento é impossível. Deste jeito você não sofrerá.
Participante: eu já fiz isso, não deu certo. Acho que a única solução é comprar sapato de um número maior…
A conversa com o ego deve ser feita através do coração (sentimentalmente) e não através da mente (racionalmente). É alterando-se o sentimento que com que se vive o momento, ou seja, aprendendo a amar a tudo e a todos (formação da consciência amorosa da ação) que se submete os desejos emanados pelo ego à realidade.
Quando vivencia aquele momento sentindo-se coagida a andar de sapato (como você mesmo disse ‘eu sou obrigada a andar calçada no meu trabalho’) ainda sofrerá. De nada adianta querer falar com o ego racionalmente: o que precisa ser alterado é o sentimento, ou seja, ir trabalhar calçada sem sentir-se obrigada a isso. Mas, para isso será preciso que aprenda a amar as restrições impostas pelo seu trabalho.
Quando falei em criar uma consciência amorosa de ação não disse que é amar apenas o que gosta ou quer fazer, mas amar a tudo, inclusive as restrições impostas pelas leis. Lembre-se sempre que Cristo ensinou: se você ama apenas o que lhe ama, que vantagem leva sobre os pagãos?
Quando ama a restrição elimina o desejo e com isso acaba o sofrimento. Sendo assim, quando amar ir trabalhar calçada em vez de ver nessa proibição um ato ditatorial do seu emprego e que você, como rebelde, precisa lutar contra, aprenderá a ir calçada sem sentir dor. Mas, enquanto se sentir obrigada a ir, sofrerá.
Aliás, deixa dizer-lhe uma coisa: a dor não nasce no pé, mas no sentimento. Veja o exemplo de muitos que não possuem mais o pé, mas ainda sentem dor e coceira neste membro.
Observação: que a dor é criada pelo ser humanizado mentalmente, mesmo que inconscientemente, foi conclusão que Allan Kardec chegou no estudo dos espíritos e, por isso, escreveu assim no seu “Ensaio Teórico da sensação nos Espíritos”: “O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primária desta é, pelo menos, a causa imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o efeito. A lembrança que da dor a alma conserva pode ser muito penosa, mas não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o calor são capazes de desorganizar os tecidos da alma, que não é suscetível de congelar-se, nem de queimar-se. Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal físico produzirem o efeito desse mal, como se real fora? Não as vemos até causar a morte? Toda gente sabe que aqueles a quem se amputou um membro costumam sentir dor no membro que lhes falta. Certo que aí não está a sede, ou, sequer, o ponto de partida da dor” (Pergunta 257).
Por isso, mesmo que compre um sapato de número maior, no seu sentimento criará a dor, porque não está indo calçada amorosamente, mas sim obrigada. Portanto, o problema não é comprar um sapato de número maior, mas se libertar emocionalmente da lei que você se escravizou.