Vamos conversar hoje sobre a convivência com o inimigo. Antes, no entanto, precisamos entender um pouco mais deste tema.
Inimigo não é só aquele que é classificado desta forma. Inimigo, na verdade, é todo aquele que é contrário a você em qualquer aspecto. Se você lava um prato de uma forma e outra pessoa de outra forma, os dois são inimigos. Se uma pessoa toma café com açúcar e outra com adoçante, elas são inimigas, pois inimigo é todo aquele que pensa diferente.

Como vivenciar o momento onde você e o outro são antagônicos em qualquer assunto e ao mesmo tempo conseguir colocar o amor universal que o aproxima de Deus? Será sobre isso que vamos falar…
Quando fala da convivência com o inimigo, Cristo é categórico: faça pelo seu inimigo mais do que ele espera de você. O mestre ensina que se o seu inimigo lhe pedir a túnica, você deve dar a capa; se ele pedir para carregar um tronco de árvore por dois quilômetros, que você deve carregar três troncos por quatro quilômetros. Ou seja, ele ensina que você deve fazer pelo seu inimigo algo que ele não espere que faça. Esta é a primeira orientação do mestre para os espiritualistas.
Segunda orientação dada também pelo próprio Cristo: é muito fácil abraçar o amigo; quero ver cumprimentar o inimigo. Repare que Cristo não fala em abraçar o inimigo, dar o mesmo tratamento que é dado ao amigo, àquele que pensa igual, mas não ignorá-lo, não virar as costas para ele, não desrespeitá-lo. O que o mestre ensina é que é preciso se ter respeito por aquele que pensa diferente.
São estes dois parâmetros, fazer pelo inimigo mais do que ele espera e respeitá-lo, que deve influenciar o espiritualista na vivência do relacionamento com uma pessoa que possui verdades antagônicas à sua. Como vivenciar o momento de antagonismo colocando estes parâmetros em prática? Vamos ver…
O que você pode fazer por uma pessoa que possui ideias antagônicas às suas e que ele não espera que faça? Concordar com ele…
Quando existe uma discussão entre dois seres sobre um assunto onde cada um tem uma ideia diferente sobre o tema, o ser humano materialista, aquele que não vivencia a vida buscando aproximar-se de Deus, quer sempre provar ao outro que está certo, provar ao outro que ele detém a verdade. Essa é a forma humana de vivenciar este relacionamento.
Já o espiritualista, quando a sua mente busca provar ao outro que está certo, ele não concorda com esta busca. Faz isso porque sabe que não precisa provar nada a ninguém. Com isso, tacitamente aceita o que o outro fala. Ao vivenciar este acontecimento desta forma, está fazendo para o outro algo que não é esperado e assim atendendo ao conselho de Cristo.
Mas, além de fazer algo não esperado, Cristo diz ainda que o espiritualista deve respeitar aqueles que pensam diferentes. O que quer dizer isso?
A vivência do acreditar no que o outro está falando é algo que a mente humana não realiza. Ela dificilmente deixa de acreditar no que acredita. O máximo que ela pode fazer é concordar com a ideia do outro para não ter briga.
Este tipo de pensamento não é fazer algo além daquilo que é esperado, mas apenas se libertar de um momento de infelicidade sem respeito ao outro. O que estou falando como caminho para seguir os dois ensinamentos de Cristo vai além: é concordar com o outro porque sabe que ele está certo e não apenas para evitar uma discussão.
Saiba de uma coisa: por mais dispares que sejam as ideias entre você e o outro, ele sempre está certo dentro do ponto de vista dele. Isso porque trata as suas ideias como verdadeiras, perfeitas, certas. Respeitar o outro é aceitar que ele tem o direito de tratar as suas ideias desta forma sem que você tenha a obrigação de mostrar que elas são erradas…
Antes de continuarmos, apenas uma ressalva: não estou dizendo que para alcançar uma vivência espiritualista você precise comungar com a ideia do outro, mas afirmo que deve vivenciar o momento dando a ele o direito de acreditar que para ele esta verdade é certa. Isso é amor ao próximo.
Amor ao próximo é uma coisa muito difícil, porque envolve a questão de direitos, que é algo que os humanos não entendem. Para os seres humanizados o direito do outro acaba onde começa o dele, ou seja, eles limitam os direitos do outro aos deles. Claro que vendo a coisa por este prisma, o outro nunca terá direitos, pois os seres humanizados, que são egoístas por natureza, vão estender ao máximo o direito deles.
Na verdade o respeito que estamos falando é algo diferente. Ele baseia-se na máxima que afirma que o direito de um ser humano começa quando o do outro acaba. Nesta visão, o que delimita os direitos é o do outro e não o do próprio ser humano. O que traça os limites do que é direito não é o direito individual daquele que está participando do momento, mas o do outro.
Dentro do direito do outro que precisa ser respeitado está crença individual de cada um. O outro tem o direito de acreditar, de tratar como verdadeiro, o que ele quiser. Tem o direito de achar certo qualquer coisa. Por isso, você que busca aproximar-se de Deus seguindo os ensinamentos dos mestres deve vivenciar o momento onde há diferença de ideias conferindo este direito ao próximo.
Aquele que estiver presente num momento da vida humana onde haja um debate, uma discussão, sem vivenciar internamente essa busca de respeitar o direito do outro crer no que quiser, estará afastando-se de Deus. Já aquele que vivenciar este momento dando ao próximo o que ele não espera receber, a concordância, e respeitando o direito dele acreditar no que quiser, estará praticando o amor universal e com isso aproveitará a encarnação para aproximar-se do Pai.
Agora, será que o que estou falando é verdade? Para verificar se alguma coisa é perfeita, no mundo de vocês existe algo chamado prova dos noves. Este método consiste em usar alguma outra coisa para testar o resultado que vocês chegaram para saber se ele é válido, é certo. Vamos tirar a prova dos nove do que eu falei?
O que posso usar para fazer a prova dos noves dessas minhas afirmações? Os ensinamentos dos outros mestres. Se todos eles são enviados de Deus, os ensinamentos deles devem sempre levar a um resultado comum.
Por isso pergunto: quando respeita o outro dando a ele o direito de acreditar no que quiser, você tem alguma intencionalidade? Não. Com isso alcança-se o ensinamento que Krishna ensinou como caminho aproximar-se de Deus e verifica-se que o resultado que chegamos é verdadeiro.
Para continuar testando o resultado que alcançamos pergunto novamente: quando você aceita como certo o que o outro fala, está tendo alguma posse, paixão ou desejo? Não. Então, o caminho traçado por Buda foi alcançado.
Acho que com as perguntas que fizemos ficou provado que este é o caminho vivencial para aquele que quer aproximar-se de Deus. Mas, existe ainda mais uma prova. Esta eu classifico como fundamental para a perfeita compreensão do tema, como um aspecto que prova de forma irrefutável o caminho que delimitei.
Estou falando da questão 887 de O Livro dos Espíritos:
“887. Jesus também disse: Amai mesmo os vossos inimigos. Ora, o amor aos inimigos não será contrário às nossas tendências naturais e a inimizade não provirá de uma falta de simpatia entre os Espíritos? Certo ninguém pode votar aos seus inimigos um amor terno e apaixonado. Não foi isso o que Jesus entender de dizer. Amar o inimigo é perdoar-lhes e lhes retribuir o mal com o bem…”
Quando o outro paga com o mal, ou seja, quando o outro retruca o que você fala dizendo que está errado e querendo ensinar o certo dele e você, ao invés de discutir o assunto cede dando ao próximo o direito de estar certo, está pagando o mal com o bem. Está pagando a intenção de estar com a verdade do outro (egoísmo) com o amor, com a paz e a harmonia com o momento presente.
Eis aí, portanto, a prova dos nove do que falamos. Eis aí, também, a vivência do espiritualista para o momento onde convive com alguém que pensa diferente dele, com o inimigo: faça por ele o que não é esperado e concorde com ele; tenha respeito, ou seja, tenha a consciência de que ele está certo porque acredita que suas verdades são verdadeiras. Vivenciando desta forma, você manterá sua paz e harmonia e estará se aproximando de Deus porque amou ao Pai acima do motivo da discussão e amou ao próximo como a si mesmo: o deixou acreditar no que quer, assim como você quer acreditar no que acha verdadeiro.
Portanto, um tema que parecia extremamente complicado de se compreender a vivência deste momento se transformou em algo tão simples. Basta apenas você reconhecer que o outro tem o direito de acreditar no que quiser e que você não precisa provar nada a ninguém.
Esta vivência, apesar de simples, no entanto, não é para todos. Para aqueles que, acreditando ou não existir algo além da matéria, queiram viver para o ser humano que são no momento, isso é quase impossível. Isso porque, movidos pelo egoísmo da mente, jamais desistirão de provar ao outro que estão certos. Já aqueles que vivem para o algo além que acreditam existir, alcançar esta vivência é algo simples de se fazer, pois eles não estão preocupados em alcançar a vitória sobre o outro, o prazer, a fama ou o elogio, mas sim em aproximar-se de Deus. Por isso, esses conseguem facilmente abrir mão da posição de certo.

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