Participante: poderia falar sobre acabar com a intencionalidade?
Não é acabar com a intencionalidade mas acabar com a intenção. São coisas diferentes.
Hoje passei o dia inteiro com a intencionalidade de estar aqui, mas não vivi com a intenção de estar. Qual a diferença? Eu tinha a intencionalidade de vir, mas não tinha a certeza se estaria ou não. Só fiquei sabendo no momento que cheguei.
Isso é viver a intencionalidade sem a intenção: querer, mas não ter a ideia se conseguirá ou não.
Entenda que a intencionalidade pode e vai sempre existir. Até porque sem intencionalidade nenhum ser humano vive. Por isso é preciso acabar com a intenção e não com a intencionalidade.
‘Tenho certeza que estarei lá à noite para assistir a palestra’. Será? Se bater com o carro durante o trajeto? Se tiver um enfarte antes de sair ou durante o caminho? Tudo isso são possibilidades que podem afetar a sua intencionalidade. Para que não cause sofrimento diga a si: se for, fui, se não for, não fui. A intenção permanece, mas a intencionalidade acaba.
Participante: se culpar por ter comprado, é cair na armadilha. Devo usar o “se comprei e não usei, dane-se!”
Perfeito, exatamente isso!
Não se culpe, não se lamente, não se prenda a ter que ser sempre perfeito. Para viver a felicidade incondicional não se pode prender a um bem material nem a uma ideia de certo, por mais que aquela informação seja tratada como absoluta. A felicidade surge quando se aprende a viver com a vida que se tem.
Quer um exemplo? A única certeza da vida é a morte. Será? Nem a morte eu sei que é certa. Só vou saber no dia em que morrer. Dizem que todo mundo morre, mas será que vou ser o primeiro que vai ficar para semente? Não sei! A gente diz que a morte é certa porque até hoje ninguém ficou vivo o tempo inteiro. Mas, será que eu vou ser o primeiro?
O buscador da felicidade nunca, é pego de surpresa, porque para ele não existe nada certo, perfeito, absoluto. Quando não se tem uma convicção absoluta sobre qualquer coisa, nada surpreende. Quando se vive com a vida dentro da concepção de que tudo pode acontecer ou pode ser verdade, nada surpreende.
Quantas coisas já pensamos que não pode acontecer, não ia acontecer e de repente aconteceu na nossa vida. Quanta coisa já imaginamos que nunca ia acontecer consigo e aconteceu?
É dessa maturidade que falo. Ela passa por nunca ser pego de surpresa, pela certeza de que todas as possibilidades são possíveis de acontecer. Possível, não certo, não certeza que vai acontecer.
O ser maduro vive cada possibilidade como uma possibilidade de algo acontecer e não com a certeza de que acontecerá.
Outro aspecto de viver com as possibilidades imaginando-as como coisas reais. Conversar com uma pessoa imaginando que conhecemos a intenção dela, que sabemos o que está pensando, projetamos a resposta que ela vai dar, conhecemos a posição que vai tomar, como vai reagir. Na hora que ela responde, acontece tudo completamente diferente.
Quantas vezes, depois de ter feito algo que magoou alguém ou causou um prejuízo, nos preparamos para uma reação contundente do outro. Chega na hora a pessoa não reage desse jeito. Sofremos antes à toa. São esses exemplos – e creio que vocês tenham muitas outras histórias sobre isso – que devem levar a entender que vivemos apenas possibilidades e não realidades. Queremos imaginar o que vai acontecer e na maioria do tempo sofremos à toa.