Como disse, este ensinamento é muito profundo e completamente contrário a tudo aquilo que o ego criou e que você vivencia como serviço ao próximo. Por isto, vamos dar um exemplo, buscando na prática a compreensão do ensinamento.
Você tem um cachorro em casa e chega uma visita que não gosta de cachorro. A convivência com esse animal perturba aquele ser humanizado. Apesar disso, você não deve preocupar-se o tempo inteiro em tirar o cachorro que cisma em ficar em volta daquele que está na sua casa.
Veja que falei em não se preocupar e não em não tirar o cachorro de perto. Também não falei para atiçar o cachorro para ficar perto daquele de quem não gosta. O que disse foi que devemos viver o que está acontecendo sem nos preocuparmos se aquilo está servindo de constrangimento ao próximo.
Os atos acontecem independentemente da sua vontade ou de qualquer outro ser universal. São acontecimentos gerados por Deus, obedecendo aos carmas que todos os seres possuem. Portanto, se Deus tirou o cachorro, era o carma daquele ser, mas se o animal voltou, essa era a única realidade que poderia acontecer.
NOTA – Conclusões que compõem o ensinamento Deus Causa Primária de todas as coisas trazido por todos os mestres ao afirmar que apenas a vontade de Deus se realiza e do ensinamento trazido pelo Espírito da Verdade na pergunta 258 de “O Livro dos Espíritos” quando afirma que o livre arbítrio do espírito consiste na escolha antes da encarnação das provas que vivenciará.
O ser universalizado conhece essa realidade e não vivencia o poder de agir livremente no mundo de Deus que o ego assegura que tem para separá-lo do Pai. Por isso, não vive os acontecimentos, mas apenas os assiste. Sua preocupação não está em fazer, mas em como reagir a eles. Como Krishna ensina: o verdadeiro sábio repousa em Mim e assiste a sua vida.
Portanto, se o cachorro saiu de perto daquele que não gosta do animal, é porque Deus o tirou, mesmo que se imagine como criador da ação. No entanto, se não saiu, não foi também porque não o tirou, mas porque o Pai o colocou ali. Você nada pode fazer com relação a isso.
Não fique preocupado com o que está acontecendo, pois independe da sua vontade, mas sim do comando do Senhor Supremo do Universo, que nunca deixará de proporcionar aos seres humanizados uma oportunidade para se libertarem de suas verdades individualizadas. Preocupe-se em manter a sua equanimidade, pois a prova também é para você.
Ficando preocupado, não conseguirá manter-se equânime, pois estará pendendo para um lado: o desejo de não deixar que o outro se perturbe. Sua aparente caridade, na verdade, é uma busca de satisfação individual, pois ela é gerada pelo aprisionamento a um desejo seu oriundo de uma paixão: satisfazer o próximo.
Se age intencionalmente (quer satisfazer o próximo), não amou no sentido universal, mas no sentido possessivo: para se satisfazer. Amar universalmente é amar sempre, não importando o que está acontecendo. Para amar verdadeiramente, ninguém pode levar vantagem alguma, nem você, nem o próximo.
É isto que Dattatreya nos ensina quando fala que o ser elevado não conhece prazer ou dor, ou quem possa ter essa busca. Afirma que o ser consegue a comunhão perfeita com Deus quando não se liga ao que a humanidade do próximo está criando como verdades. Está atento apenas em amar incondicionalmente ao espírito que está encarnado para auxiliá-lo a passar por tudo o que precisa.
Não gostar de cachorro ou de qualquer outra coisa desse mundo é um maya, pois é resultado de uma verdade individual. Quando quer tirar o cachorro porque aquele não gosta, além de também ser um desejo criado por um maya (eu tenho que tirá-lo de cima de quem não gosta) estará servindo ao maya ou a ele?
Da unidade com Deus, que surge com o fim das verdades individuais, nasce um mundo onde você está plenamente integrado ao acontecimento. Acabam-se os quereres, a vontade de alterar a realidade, o desejo de se satisfazer ou não.
Quem vive em perfeita harmonia com o seu eu celestial não cria suposições: ‘aconteceu? Aconteceu, o que posso fazer?’ Esse ser não se imagina potente para interferir na realidade, nem se preocupa imaginando que o que está se passando poderia ou não ser alterado. ‘Estou recebendo a visita e o cachorro vem para perturbá-la, o que posso fazer?’
O ser liberto do aprisionamento às suas verdades não se preocupa com os acontecimentos nem se culpa porque o cachorro perturbou a visita. Sabe que, se essa foi a ação que ocorreu, tinha que ser assim. Agora, se a visita se sentiu ofendida com isso, é porque possui mayas ou ilusões às quais se apega. Foi por isso que sofreu.